TEXTO I
A 13 de fevereiro de 1946, Graciliano Ramos escreve
uma carta a Cândido Portinari relembrando uma visita que
lhe fizera quando tivera a ocasião de apreciar algumas
telas da série Retirantes . Diz o escritor alagoano:
Caríssimo Portinari:
A sua carta chegou muito atrasada, e receio que esta
resposta já não o ache fixando na tela a nossa pobre
gente da roça. Não há trabalho mais digno, penso eu.
Dizem que somos pessimistas e exibimos deformações;
contudo, as deformações e essa miséria existem fora da
arte e são cultivadas pelos que nos censuram. [...]
Dos quadros que você me mostrou quando almocei no
Cosme Velho pela última vez, o que mais me comoveu foi
aquela mãe com a criança morta. Saí de sua casa com um
pensamento horrível: numa sociedade sem classes e sem
miséria, seria possível fazer-se aquilo? Numa vida tranquila
e feliz, que espécie de arte surgiria? Chego a pensar que
teríamos cromos, anjinhos cor-de-rosa, e isto me horroriza.
Graciliano
Disponível em: https://graciliano.com.br.
Acesso em: 6 fev. 2024 (adaptado).
TEXTO II
Histórias de ninar (adultos)
Houve um tempo — tão perto, e, ó, tão longe — em que
a arte era um holofote na unha encravada, não um
campeonato de melhores esmaltes.
Raskolnikov matava velhinhas, a família de Gregor
Samsa o assassinava a “maçãzadas”, Memórias póstumas
de Brás Cubas (Machado de Assis) é o retrato mais
perfeito de tudo o que tem de pior na sociedade brasileira,
uma sequência tristemente hilária de ações moralmente
condenáveis, atitudes pusilânimes, cálculos mesquinhos e
maus passos cretinos. A literatura, o cinema e o teatro vêm se transformando
num exercício de lacração: o mal está sempre no outro, os
protagonistas são ironmen /women da virtude. A pessoa
sai da leitura ou da sessão não com a guarda abaixada,
as certezas abaladas, mais próxima da verdade (ou, à falta
de uma palavra melhor, da sinceridade): sai com suas
certezas reforçadas.
A realidade é confusa. Contraditória. Muitas vezes
incompreensível. A arte é onde tentamos nos mostrar nus,
com todos os nossos defeitos.
PRATA, A. Disponível em: www1.folha.uol.com.br.
Acesso em: 12 jan. 2024 (adaptado).
No que diz respeito à arte, o posicionamento de Antônio
Prata, no Texto II, aproxima-se da tese de Graciliano Ramos,
no Texto I, uma vez que ambos
a) defendem a dignidade do ofício dos artistas.
b) concluem que a arte reforça crenças pessoais.
c) apresentam a pobreza como inspiração para a arte.
d) afirmam o necessário caráter desestabilizador da arte.
e) atestam que há mudanças significativas na produção
artística.